"PALAVRAS NÃO SÃO A ÚNICA MANEIRA DE SE DIZER ÀS PESSOAS O QUE SE QUER DIZER."

31 agosto, 2009

O que é ensinar Filosofia? Uma maneira de se ensinar a pensar o mundo.

É engraçado começar um texto que vise dizer o que é Filosofia e qual sua função de maneira geral na sociedade e no ensino, afinal confunde-se muito a Filosofia propriamente com “filosofia de vida”, ou seja, confunde-se o que se estuda em uma faculdade de Filosofia com o que costumeiramente as pessoas chamam de filosofia. Poderia aqui fazer uma distinção entre Filosofia com “F” maiúsculo e filosofia com “f” minúsculo. Mas como fazer essa distinção? Seria trivial apenas explicar que a Filosofia com “F” maiúsculo é a que se ensina nas universidades e a filosofia com o “f” minúsculo é o que a sociedade costuma chamar de “filosofia de vida”, assim como alguém que diz: — Minha Filosofia de vida é manter-me saudável, comendo apenas coisas naturais e na medida exata. Porém exatamente por se ter essa distinção como recorrente na sociedade é que muitos alunos chegam às universidades para aprender Filosofia acreditando que as “aulas” seriam bate-papos e devaneios sobre qualquer tema aleatório, ou ainda buscando de maneira geral um “sentido para a vida”.
Entretanto, o que se ensina nas universidades, ou seja, nas faculdades de Filosofia é o que os grandes filósofos disseram sobre determinados temas que construíram a nossa vasta biblioteca do saber. Todo saber cientifico teve certa influência filosófica no decorrer do tempo; por trás das grandes invenções, estudos e descobertas houve uma teoria filosófica que debatesse e tentasse dar conta de tais. O que ocorre, no entanto é que as pessoas chegam às aulas de Filosofia sem saber que se lêem textos de difíceis compreensão e escrita, de temas que muitas vezes não nos chamam a atenção, como o conhecimento, o ser, o belo, o bom, porque de algum modo não possuem uma serventia imediata (práxis), mas apenas discussões teóricas, ou em outras palavras construções de cenários que visam explicar as coisas e conceituá-las. Temos aqui uma grande confusão que perdura desde muito, essa confusão diz às pessoas que nunca tiveram contato com a Filosofia que expressar a opinião (doxa) é fazer Filosofia.
Mas depois de determinar o que seria a Filosofia, ou seja a Filosofia do mundo acadêmico e dos grandes filósofos, temos ainda outra preocupação um tanto grave: temos que ainda dividir essa conceituação em dois outros conceitos, assim sendo a Filosofia diferencia-se do que se costuma chamar de filosofia, porém ainda existe uma diferença entre Filosofia e a Filosofia acadêmica, ou em outras palavras Filosofia e História da Filosofia. Essa diferença surgiu com o decorrer do tempo, em que se criou uma tradição de se ensinar nas universidades o que os grandes filósofos disseram e escreveram e de se trabalhar com os conceitos por eles apresentados. Obviamente se faz necessário apresentar a História da Filosofia para que os nossos estudantes não pensem as mesmas coisas que já foram apresentadas pelos grandes filósofos, porém isso não seria apenas ensinar História da Filosofia e não Filosofia?
Seria interessante buscar trabalhar com a História da Filosofia a fim de que se pudesse fazer os alunos pensarem por si mesmos, e desta maneira chegar aos conceitos que os grandes filósofos apresentaram: se faz necessário percorrer o mesmo caminho feito conceitualmente que os grandes filósofos fizeram, mas usando da História da Filosofia como instrumento do ensino da Filosofia como maneira de pensar, argumentar e perceber. Filosofia seria então pensar criticamente sobre o que percebemos; seria perceber, refletir, conceituar e criticar tudo que percebemos de maneira concisa e inteligente, logicamente coerente.
Tendo buscado fundamentalmente o que de fato é Filosofia e de certo modo como e o que devemos ensinar, fica a pergunta: o que ensinar sobre Filosofia fora das universidades, ou seja, nas escolas? O que ensinar sobre Filosofia aos nossos adolescentes e crianças que estão em nossas escolas? Visto que a Filosofia tem como tarefa apresentar de certa forma a história do conhecimento, e também ensinar o aluno a “pensar” no mais restrito do termo, não se pode jogar nas mãos da Filosofia a tarefa de “educar” o pensamento dos nossos alunos juvenis. Ela tem sim uma responsabilidade muito grande na educação conceitual de nossas crianças e adolescentes, mas deve antes de qualquer coisa ser um instrumento junto às outras disciplinas para que se possa aumentar a capacidade e entendimento de mundo, além de facilitar o convívio social e mundano que terão em nossa sociedade contemporânea. Temas como preconceito, sexualidade, diferenças Religião, Ciência e Filosofia, direitos e deveres do cidadão frente à sociedade devem caminhar em conjunto com a história universal em História, a geografia local em Geografia, a Teoria dos conjuntos na Matemática, a Mecânica newtoniana em Física, a Lei de conservação de energia em Química, a análise sintática em Português.
Ensinar a pensar não é só tarefa da Filosofia, e ensinar nossas crianças e adolescentes o que os grandes filósofos disseram assim como se faz nas universidades seria uma tortura mental e um desleixo com a necessidade de estimulo intelectual e criativo. A Filosofia nas universidades, assim como já foi dito, deve estimular seus alunos a criar e pensar por si mesmos com o auxílio da história, bem como o ensino nas escolas deve estimular as crianças a se tornarem mais cientes do mundo em que vivem e dos problemas que a sociedade possui, e desta maneira refletir e conceituar coisas que serão necessárias para sua própria vivência.
É fato que os assuntos tratados pelos grandes filósofos e também nas universidades são complexos para serem trabalhados nas escolas, porém nada impede que com o auxílio das outras disciplinas se introduza assuntos que também carecem de reflexão filosófica, porém mais sutis, e assim se crie e transforme nossos adolescentes em pessoas mais críticas e mais conscientes, ou seja, pessoas capazes de terem uma atitude mais reflexiva sobre o mundo e a sociedade. Ensinando desde já aos nossos adolescentes e crianças a pensar criticamente o mundo em conjunto com as disciplinas ensinadas nas escolas, os tornam aptos a pensar o que é pensar o mundo nas universidades não importando que curso e profissão que seguirão.

Um comentário:

  1. Esse post não poderia evoluir para um artigo sobre Filosofia na educação?

    Estava com saudade dos seus escritos, da boa construção das idéias e dos temas.

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